Inclusões não-metálicas
Como se viu, as impurezas normais são o fósforo, o enxofre, o manganês,
o silício e o alumínio. A maior parte delas reage entre si ou com outros
elementos não-metálicos como o oxigênio e, eventualmente, o nitrogênio,
formando as chamadas “inclusões não metálicas”. A formação dessas inclusões se
dá, em grande parte, na fase final de desoxidação os aços.
Devido à tendência de se produzirem aços com propriedades cada vez
melhores, em face das condições de sua aplicação se tornarem cada vez mais
severas, o estudo do efeito das inclusões nessas propriedades e o
aperfeiçoamento das condições de fabricação, têm concentrado, nos últimos anos,
a atenção dos estudiosos na matéria.
Na realidade, algumas das inclusões podem até mesmo serem consideradas
necessárias ou benéficas devido ao efeito de certo modo positivo que pode
acarretar. Mesmo assim, e principalmente quando as condições de serviço
provocam o aparecimento de esforços cíclicos e alternados, alguns tipos de
inclusões podem ser prejudiciais, sobretudo quando sua quantidade, forma e
dimensões estão além do que se considera aceitável.
Dentre as impurezas, o fósforo foi considerado, por muito tempo, um
elemento exclusivamente nocivo, devido à fragilidade a frio que confere aos
aços, sobretudo nos aços duros, de alto carbono e quando seu teor ultrapassa
certos limites. Pós essa razão, as especificações são rigorosas a respeito.
Certas especificações restringem as porcentagens máximas admissíveis aos
valores abaixo, conforme as aplicações consideradas.
Trilhos
|
eixos
|
estrutura
de
pontes
|
estrutura
de construção e barras de concreto armado
|
0,04%
|
0,05%
|
0,06%
|
0,10%
|
Nos aços-liga, o fósforo é especificado com 0,04% no máximo em
alguns casos e em outros, 0,025% máximo. Não possui esse elemento tendência a
formar carbonetos, mas dissolve-se na ferrita, endurecendo-a e aumentando o
tamanho de grão do material, ocasionando a “fragilidade a frio”, representada
por baixa resistência ao choque ou baixa tenacidade. Essa influência é tanto
mais séria, quanto mais alto o teor de carbono do aço.
Por outro lado, o fósforo apresenta alguns aspectos favoráveis, pois ao
aumentar a dureza do aço, aumenta igualmente sua resistência à tração, fato
esse que pode ser aproveitado nos aços de baixo carbono onde seu efeito nocivo
é menor, juntamente com outros elementos como cobre, níquel e cromo em baixos
teores. Além disso, o fósforo melhora a resistência à corrosão e a
usinabilidade dos aços, principalmente neste último caso, quando adicionado
juntamente com o enxofre.
O fósforo de se caracteriza por ser um tanto incompatível com o carbono,
ou seja, ele tende a expulsar o carbono da austenita, de modo que, quando no
resfriamento se ultrapassa a linha Ar, as áreas originalmente ricas em fósforo
ficam praticamente constituídas somente de ferrita, com ausência quase que
completa de perlita . A figura 1 mostra a
estrutura que resulta desse fenômeno – denominado textura “ghost lines” –
caracterizada, como se vê, por estrias constituídas quase que exclusivamente de
ferrita, devido à presença de fósforo, agrupando-se a perlita, por seu turno,
nas beiradas dessas faixas.
Fig. 1 – Aspecto micrográfico de
aço doce forjado mostrando a textura chamada “ghost lines”. Ataque: reativo de
nital. Aumento: 100 vezes.
Um alto teor de fósforo pode acarretar a presença de um eutético
fosforoso. A figura 2 reproduz o aspecto micrográfico de aço meio doce
moldado com fósforo elevado. O fenômeno que ocorre quando o fósforo se situa em
torno de 0,4% é nocivo, pois o eutético fosforoso funde à temperatura pouco
acima de 1000°C, o que pode ocasionar a ruptura ou esboroamento do aço se
este for deformado a quente. Como, entretanto, teores altos de fósforo nos aços
não são comuns, as estruturas do tipo apresentado na figura 2 são
relativamente raras.
Fig. 2 – Aspecto micrográfico de aço meio doce moldado com alto teor
de
fósforo notado pela presença de um eutético fosforoso, existente quando
o teor de fósforo se situa em torno de 0,4%.
Nota-se no eutético inclusão de MnS. Ataque: reativo de nital. Aumento:
700 vezes.
Quanto os outros elementos, enxofre, manganês, silício e alumínio, ele
são os principais responsáveis pela formação de inclusões não-metálicas.
Estas, de acordo com sua origem, podem ser classificadas em dois grupos
principais (1):
- “endógenas”, as quais são devidas a reações que se desenrolam durante
a elaboração do aço ou durante sua solidificação e geradas pela precipitação do
enxofre e do oxigênio sob a forma de sulfetos, óxidos, silicatos e aluminatos;
- “exógenas”, derivadas de fontes externas, como de escórias,
corrosão ou erosão dos refratários das paredes do forno e canais de vazamento,
metais e ligas de dissolução difícil no banho metálico, etc. Essas inclusões
exógenas são geralmente constituídas de silicatos, aluminatos e
óxidos vários e se caracterizam por dimensões maiores, forma irregular e
constituição complexa.
É importante assinalar que o comportamento das inclusões sob o ponto de
vista de deformabilidade, quando o aço é sujeito à conformação mecânica, pode
alterar o seu característico de maior ou menor nocividade.
De fato, de início as inclusões podem ser imaginadas como partículas
esféricas ou globulares de pequenas dimensões. No processo de conformação
mecânica, algumas delas se alongam na direção da laminação, por exemplo,
enquanto outras se mantêm intactas ou se fragmentam em partículas menores
(2).
Silicatos e sulfetos, por exemplo, formam estrias alongadas. Contudo, ao
passo que as estrias de sulfetos têm extremidades com raios apreciáveis, as de
silicato apresentam nas extremidades arestas vivas, mais favoráveis à
concentração de tensões e iniciação de micro-fissuras.
Alumínio, por outro lado, fragmenta-se em partículas diminutas,
com menor prejuízo para o aço.
Como já se mencionou, as inclusões nos aços são de várias naturezas e
são devidas a uma série de causas, todas elas ligadas a reações que ocorrem no
aço líquido, durante seu processo de fabricação.
As causas mais importantes são:
- precipitação, durante o processo de solidificação do aço, de
óxidos e sulfetos cuja solubilidade no aço líquido ou sólido diminui à medida
que cai a temperatura;
- separação deficiente dos produtos de oxidação e de sulfuração
resultantes da adição de desoxidantes e desulfurantes;
- formação de escórias nos fornos e nas panelas de vazamento;
- arrastamento para o metal líquido de produtos de erosão e corrosão do
material refratário das paredes dos fornos ou dos canais de vazamento;
- adição de produtos como ferro-ligas ou aditivos de fundição, mais
difíceis de se dissolverem no banho metálico.
Em resumo, as inclusões formadas em função desses vários fenômenos
químicos e mecânicos correspondem a compostos químicos como óxidos diversos,
sulfetos, silicatos e aluminatos.
A quantidade de inclusões é muito grande; admite-se que uma tonelada de
aço-carbono comum possua cerca de 10(12) e 10(13) inclusões somente de óxidos,
sendo que a maior quantidade, cerca de 98%, tem dimensões inferiores a 02
micron. Desse modo, somente 1 a 2 % são visíveis ao microscópio. As
inclusões de sulfetos são, em quantidade, da mesma ordem de grandeza.
No caso de “aços efervescentes”, as inclusões de óxidos podem atingir
dimensões superiores a 30 microns na camada superficial do aço. Esses
óxidos são principalmente FeO, MnO, Al2O3, e SiO2 e o seu agrupamento junto à
superfície pode provocar defeitos superficiais nos laminados a frio.
Outros tipos de inclusões nos aços efervescentes são os sulfetos FeS e
MnS que se localizam nas regiões de maior segregação e, portanto, são
igualmente prejudiciais.
O sulfeto de ferro possui um ponto de fusão muito baixo, em relação ao
do aço (o FeS solidifica em torno de 1000°C), de modo que sua presença nos
processos de conformação mecânica a quente, realizados normalmente acima de 1000°C,
confere ao aço a chamada “fragilidade a quente”, defeito que deve ser evitado
para permitir uma conformação mecânica correta. Nessas condições, faz-se
necessária a adição do manganês, pois o enxofre tem maior afinidade por esse
elemento do que pelo ferro e o sulfeto de manganês formado, cujo ponto de fusão
é em torno de 1600°C, elimina a fragilidade a quente. Além disso, o
MnS forma-se em partículas diminutas, relativamente plásticas, deformando-se e
amoldando-se no sentido em que o material é trabalhado.
Sugere-se que a relação Mn/S seja superior a 4 para garantir a formação
de MnS.
Contudo, como as outras inclusões, o MnS pode ser prejudicial,
principalmente nos aços efervescentes e semi-acalmados onde o teor de oxigênio
é mais elevado que o normal. Pode-se ter, então, a formação de inclusões duplex, caracterizadas por serem constituídas de silicatos monofásicos ou óxidos
multifásicos possuído uma camada de sulfeto que pode atingir dimensões maiores
que 100 microns. Se tais inclusões se formarem nas proximidades de bolhas, elas
dão origem ao defeito chamado “pontos pretos”. O aço é, em conseqüência,
prejudicado quando submetido à operação de dobramento e estiramento a frio.
A substituição do silício pelo alumínio na fase de desoxidação reduz o
efeito nocivo dos pontos pretos, pois seu número e dimensões ficam diminuídos.
De qualquer modo, pela ação relativamente prejudicial do enxofre,
procura-se mantê-lo até 0,05% ou pouco mais nos aços-carbono comuns e até
0,025% nos aços-lia especiais.
Excetua-se o caso dos aços de usinagem fácil, ode a presença de MnS em
quantidades maiores – exigindo pois maiores porcentagens de enxofre e manganês
nesses aços, interrompem a continuidade da matriz ferrítica que, como se sabe,
é muito plástica; obtém-se, assim, condições de usinagem mais rápida, com menor
potência e melhor acabamento superficial.
O efeito do enxofre sobre as propriedades mecânicas do aço é mínimo,
quando o teor de carbono é muito baixo, tornando-se mais sensível, no
sentido negativo, quando aumenta a quantidade de carbono. As propriedades mais
afetadas são a resistência à tração, a ductilidade e a tenacidade. Cumpre
ressaltar, entretanto, que até o limite de 0,1% de enxofre, essa influência não
é tão pronunciada como às vezes se admite.
O manganês, além de atuar como agente desulfurante, atua do mesmo modo
que o silício e o alumínio, como elemento desoxidante. De fato, o manganês, ao
reagir com o oxigênio, forma o composto sólido MnO, de preferência ao CO ou
CO2, evitando assim o desprendimento de bolhas. O MnO não exerce influência de
maior vulto.
O manganês que não se combinou com o enxofre ou com o oxigênio pode
atuar de duas maneiras: quando o teor de carbono é baixo, ele se dissolve na
ferrita, aumentando sua dureza e resistência mecânica: com teor de carbono mais
elevado, admite-se que se forme o composto Mn3C que se associaria co o
Fe3C, aumentando ainda mais a dureza e a resistência do aço. Normalmente, o
manganês é especificado em teores que variam de 0,23% a 0,9%, podendo em certos
casos (aços de usinagem fácil) apresentar valores mais elevados. Em teores
acima de 1%, portanto, já deve ser considerada sua influência no sentido de
conferir aos aços características especiais.
O silício, responsável pela formação de silicatos, varia nos aços comuns
de 0,05 a0,3%. Dissolve-se na ferrita do mesmo modo que o fósforo, sem,
contudo, afetar apreciavelmente a sua ductilidade, embora aumente ligeiramente
a sua dureza e a sua resistência mecânica. A função principal do silício é a de
agente desoxidante, isto é, quando adicionado ao aço líquido combina-se com o
oxigênio, originando compostos sólidos e evitando a combinação do oxigênio com
o carbono, o que provocaria o desprendimento de CO ou CO2 com a resultante
formação de bolhas. Entretanto, não se deve esquecer a ação das inclusões de
silicatos.
O alumínio, adicionado em princípio como desoxidante, age nesse sentido
mas eficientemente que o silício e o manganês, formando com o oxigênio
inclusões em partículas diminutas, com menor efeito nocivo para o aço. O
alumínio atua, ainda, como elemento controlador do crescimento de grãos nos
aços.
O "hidrogênio", de um modo geral, aparece em teores de 0,001
a 0,0001%. A sua presença produz certa fragilidade no material.
O "nitrogênio", que se dissolve na ferrita, produz nos aços de
baixo carbono o fenômeno de endurecimento por precipitação, visto que sua
solubilidade na ferrita é, à temperatura ambiente, de somente 0,001%(110)
aumentando a pouco mais de 0,02% a 425°C. Desse modo, quando seu teor
estiver acima de 0,01% poderá causar aquele fenômeno. Esse elemento,
precipitado em tais aços, sob certas condições, pode ser notado ao microscópio
como agulhas de nitreto de ferro.
O "oxigênio" forma uma variedade de óxidos líquidos ou
gasosos, quando o aço está fundido. Quando o aço solidifica, alguns desses
óxidos permanecem na forma de bolhas; outros, isolados ou combinados com outros
óxidos formam compostos resultando, como já se viu, em inclusões não-metálicas.
Um outro elemento que pode estar presente nos aços é o
"estanho", devido ao emprego de sucata estanhada. O estanho pode
tornar suscetível à fragilidade a quente e à fragilidade de revenido.
Outros elementos residuais que podem ser encontrados nos aços são certos
elementos de liga existentes nas matérias primas empregadas na fabricação do
aço. Então nesse caso, o titânio, o vanádio o zircônio, o cromo e o cobre. Como
elementos residuais, pouco afetam, isoladamente, as propriedades daquelas
ligas. Contudo, como a maioria desses elementos aumenta a endurecibilidade dos
aços, seu efeito adicionado pode ter conseqüências indesejáveis, principalmente
quando a ductilidade é fator crítico, como em aplicações de estampagem
profunda. Por isso, os fabricantes de aço devem ter o cuidado de reduzir ao
mínimo a quantidade desses elementos nos aços comuns, mediante uma seleção
cuidadosa da sucata utilizada.
Para concluir, no que se refere a impurezas e inclusões não-metálicas,
pode-se tirar as seguintes conclusões:
- o enxofre, o fósforo, o oxigênio, o hidrogênio são elementos
considerados indesejáveis sob o ponto de vista de qualidade de aço: o fósforo
pela sua ação como elemento que pode acarretar a "fragilidade a
frio"; o enxofre pelos sulfetos que forma, sobretudo o de ferro que pode
acarretar a "fragilidade a quente"; o oxigênio, pelas inclusões que
forma e o hidrogênio pela fragilidade que pode conferir ao aço. Esses elementos
não podem ser totalmente eliminados, nas condições normais de fabricação dos
produtos siderúrgicos, mas devem ser mantidos dentro de faixas de teor que não
ultrapassem os limites de influência prejudicial àqueles produtos;
- o manganês, o silício e o alumínio, os três agindo como desoxidantes
e manganês também como desulfurante são elementos de um lado
benéficos, mas de outro lado prejudiciais pelas inclusões que formam de
sulfetos, silicatos e aluminatos;
- o conceito "aço limpo", ou seja, isento de inclusões é
relativo, porque, sob o ponto de vista técnico é impossível um aço totalmente
isento de inclusões; além disso, algumas delas - as micro-inclusões - são em
geral necessárias. o importante é a identificação dessas inclusões sob os
pontos de vista de composição, quantidade e dimensões e otimizar os processos
de fabricação dos produtos siderúrgicos, de modo a que elas afetem o menos
possível as propriedades básicas daqueles produtos. As inclusões mais
prejudiciais são as macro-inclusões: freqüentemente utiliza-se como fronteira
que separa as micro das macro-inclusões a dimensão de inclusão de 5 a 100
microns.
- outro fator importante a considerar é a deformabilidade das inclusões: os óxidos FeO, MnO e (Fe,MnO) apresentam alta deformabilidade à
temperatura ambiente e perdem gradualmente esse característico na faixa de
temperaturas de 400° a 800°C; o Al2O3 e aluminatos de cálcio são
indeformáveis em toda a faixa de temperaturas de fabricação do aço, assim como
os óxidos duplos tipos “spinel” (de alumínio e magnésio, por exemplo); os
silicatos são indeformáveis à temperatura ambiente, mas dependendo de sua
composição, tornam-se altamente deformáveis na faixa de 800 a 1300
graus C, a qual corresponde à da maioria das operações de conformação mecânica
dos aços. Por esse motivo, essas inclusões são de grande importância para
as propriedades finais desses produtos; o MnS é altamente deformável até
temperaturas em torno de 1000 graus C a partir da qual sua deformabilidade
diminui gradualmente.
- finalmente, a necessidade mundial crescente de aços de melhor
qualidade envolve uma série de providências por parte dos produtores, as quais
devem abranger todo o ciclo de produção do aço, desde as práticas do refino do
aço líquido até sua transferência aos moldes. Entre as técnicas que estão sendo
adotadas para reduzir o efeito prejudicial das inclusões não-metálicas pode-se
citar as seguintes: tratamento a vácuo do aço na panela, de modo a minimizar os
seus níveis de oxidação; a injeção na panela, prática relativamente recente,a
qual, se realizada sob condições de perfeito controle, pode significar uma
importante contribuição no que se refere à remoção do enxofre, modificação das
inclusões endógenas e redução do volume total de inclusões; seleção correta dos
revestimentos refratários de modo a reduzir as inclusões exógenas; prevenção
para impedir a transferência de escórias do forno e da panela às fases
subseqüentes do processamento do aço; projeto adequado das panelas
intermediárias, incluindo o seu revestimento e assim em seguida. É claro que todas
essas práticas significam um aumento de custo de produção, fato esse sem dúvida
compensado pela melhor qualidade do aço produzido.
Nenhum comentário:
Postar um comentário